USP identifica locais de deslizamento na costa de SP

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A expectativa é que, até o final de 2025, uma nova metodologia que identifique áreas vulneráveis a deslizamentos esteja disponível para embasar a formulação de políticas públicas para o município – Foto: Carlos Henrique Grohmann – Obtida mediante Google Earth

O município de São Sebastião, localizado no Litoral Norte de São Paulo, que enfrentou severas consequências após chuvas intensas durante o Carnaval de 2023, registra 1.000 pontos de potencial deslizamento de terra. Essa informação foi obtida a partir de um inventário realizado por pesquisadores dos Institutos de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG) e de Geociências (IGc) da USP, utilizando imagens aéreas coletadas logo após o episódio de chuvas. Em continuidade à pesquisa, os cientistas estão agora analisando imagens em alta resolução capturadas com a técnica LiDAR, além de realizar uma combinação com outras variáveis para criar um método que permita identificar, com maior exatidão, o risco de novos deslizamentos. O LiDAR é uma tecnologia de sensoriamento remoto que utiliza laser pulsado para medir distâncias, gerando dados com elevada precisão.

O professor Carlos Henrique Grohmann, coordenador do projeto no IAG, explica que “na análise de suscetibilidade, é aplicado o conhecimento previamente disponível sobre as áreas que sofreram escorregamentos, juntamente com dados como relevo e geologia, e, a partir disso, extrapolamos para outras regiões. Atualmente, dispomos de modelos digitais de elevação com uma resolução espacial de 30 metros. O uso do LiDAR nos proporciona um avanço significativo, com modelos de elevação de alta resolução, chegando a até 1 metro de precisão.”

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Sahy, uma das áreas mais atingidas pelos fortes temporais ocorridos em fevereiro de 2023. Foto: Rovena Rosa | Agência Brasil

A execução desse projeto conta com o apoio da Fapesp e a colaboração do Instituto Geográfico e Cartográfico de São Paulo (IGC-SP), que está implementando um banco de dados com imagens capturadas por laser em todo o Estado.

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Operação de limpeza na rodovia Rio-Santos, na região da Barra do Sahy, no litoral paulista. | Foto: Sérgio Barzagui | Governo do Estado de São Paulo

Essa é a primeira vez que os dados LiDAR são acessíveis para a comunidade científica na região da Serra do Mar. Até 2025, espera-se que a nova metodologia destinada a identificar áreas vulneráveis a deslizamentos possa ser aplicada na elaboração de planejamentos urbanos e formulação de políticas públicas no município.

Em fevereiro do ano passado, São Sebastião declarou estado de emergência devido aos danos causados por um volume de chuvas histórico — 683 milímetros (mm) em menos de 15 horas, comparado a uma média mensal de 300 mm. O trágico evento resultou na morte de pelo menos 60 pessoas, além de provocar o deslocamento de centenas de residentes e danos relevantes à infraestrutura. Muitas estradas ficaram danificadas ou bloqueadas, dificultando o transporte e a locomoção na área. O professor Grohmann destaca: “O que aconteceu em São Sebastião foi um evento anômalo, bem fora do padrão. Entretanto, sabemos que durante o verão ocorrem chuvas intensas, acompanhadas de deslizamentos de terra e a questão é que agora temos áreas que antes eram cobertas por vegetação e que perderam essa proteção, tornando-se mais suscetíveis.”

Novas ferramentas

Pesquisas científicas indicam que, com o aquecimento global, a frequência e intensidade de fenômenos climáticos extremos, como secas severas e chuvas intensas, tendem a aumentar. Segundo o Relatório Síntese de 2023 do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), a temperatura mundial subiu 1,1°C em relação ao período pré-industrial (1850-1900) e deve atingir 1,5°C na primeira metade da década de 2030. O ano anterior foi classificado como o mais quente da história do planeta, segundo a Organização Meteorológica Mundial (OMM). Esse novo cenário requer ações de mitigação e planejamento fundamentadas em informações atualizadas.

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Imagem: Reprodução | Twitter @_dersp

No último levantamento realizado pelo Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), constatou-se que, em 2018, aproximadamente 2.200 residências estavam situadas em 21 áreas de risco de deslizamento dentro de São Sebastião. Após a tragédia, a prefeitura contratou o IPT em fevereiro deste ano para atualizar o mapeamento dessas áreas de risco. Com um território de 402 km² e uma população de pouco mais de 81 mil moradores, o município incluía, entre os bairros reconhecidos pelo IPT à época, Barra do Una, Juquehy, Barra do Sahy, Baleia, Camburi, Boiçucanga e Itatinga, todos afetados pelas chuvas de fevereiro de 2023. Os deslizamentos de terra ocorrem com frequência em regiões montanhosas, especialmente em clima tropical, como o que predomina na Serra do Mar, onde está localizado o município. Eles podem se manifestar em diversas escalas e são um dos principais agentes de erosão, contribuindo para modificações geomórficas nas encostas.

Dada a gravidade dos efeitos destrutivos em áreas ocupadas irregularmente, a identificação, caracterização, monitoramento e prevenção de deslizamentos tornou-se um foco de estudos. “Vários órgãos de governo estão realizando análises semelhantes. Nossa intenção é também comparar os dados que obtivermos com esses dados oficiais”, comenta o professor. Os cientistas da USP estão utilizando imagens de drones, modelagem tridimensional e sensoriamento por LiDAR, que proporciona a possibilidade de determinar a altura dos objetos mapeados através da variação de tempo entre a emissão e o retorno dos feixes laser disparados de uma aeronave. Combinados com outros dados coletados pelo sistema aéreo, esses métodos fornecem informações tridimensionais sobre o relevo e características da superfície, que permitem não apenas observar a estrutura da vegetação, mas também “ver” o solo sem a cobertura vegetal. Isso torna viável a avaliação da topografia de um local sem a interferência da floresta ou de edificações.

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Praia do Camburizinho, vizinha ao Morro da Baleia, em São Sebastião. | Fotografias de campo realizadas em 2023 (à esquerda) e 2024. Crédito: Carlos Henrique Grohmann

Os pesquisadores visam não apenas entender como se comportam as áreas de escorregamento em São Sebastião, mas também realizar uma caracterização morfométrica e avaliar qualquer mudança na superfície topográfica em um deslizamento monitorado no bairro Toque-Toque Grande (que está sob vigilância desde 2010) e em pontos dos Morros da Baleia e do Sahy. O inventário que identificou os pontos de deslizamento no município foi publicado em 20 de setembro no Brazilian Journal of Geology e os dados estarão disponíveis no Zenodo, um repositório de acesso aberto que facilita a troca de dados e softwares. Essa iniciativa também conta com suporte da Fapesp através de dois projetos.

Para ler o artigo completo em inglês, acesse Landslides of the 2023 summer event of São Sebastião, southeastern Brazil: spatial dataset.

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