Jornalista brasileiro Marcel Gomes conquista prêmio Nobel Ecológico” em 2024.

desmatamento

O jornalista brasileiro Marcel Gomes, secretário-executivo da Repórter Brasil, será laureado com o Prêmio Goldman de Meio Ambiente de 2024 por ter planejado e coordenado uma investigação jornalística internacional que vinculou a carne vendida pela JBS em supermercados europeus ao desmatamento ilegal na Amazônia, no Cerrado e no Pantanal. Com base nas evidências dessa investigação, seis grandes redes de supermercados europeus na Bélgica, França, Holanda e no Reino Unido, que juntas somam mais de US$ 30 bilhões em vendas, suspenderam indefinidamente a venda de produtos da JBS em dezembro de 2021.

“Ter mais transparência na compra e venda de produtos, nas cadeias de suprimentos de commodities, é uma maneira de pressionar para que todos – empresas, governos e consumidores – estejam mais atentos a práticas de produção que não sejam sustentáveis”, resume Gomes.

Concedido pela Fundação Goldman, o prêmio é conhecido como o Nobel do ambientalismo e homenageia anualmente seis defensores ambientais de diferentes regiões do mundo: África, Ásia, Europa, Ilhas e Nações-Ilhas, além das Américas (Norte, Sul e Central). Marcel Gomes é o quinto brasileiro a receber o prêmio. Em edições anteriores, a ministra Marina Silva e a liderança indígena Alessandra Munduruku já foram contempladas.

“Este prêmio reconhece o impacto que o jornalismo pode ter para proteger o meio ambiente e, no fim, melhorar a vida das pessoas. A Repórter Brasil foi capaz de fazer o rastreamento da cadeia da carne brasileira da fazenda até os supermercados no exterior, o que empresas diziam não ser possível fazer”, explica Gomes.

Os vencedores do prêmio serão homenageados nesta segunda-feira (29) em uma cerimônia presencial em São Francisco. Uma segunda cerimônia será realizada em Washington, DC, no dia 1º de maio. Os vencedores deste ano estão listados ao final do texto.

Transparência e a maior produtora de carne do mundo

Em 2008, Marcel Gomes começou a construir a equipe de investigação da Repórter Brasil, utilizando uma rede de base de comunidades indígenas, ONGs locais e sindicatos de trabalhadores agrícolas para desenvolver um sistema de rastreamento da cadeia de suprimentos para a agricultura industrial. À medida que a pecuária se tornou o maior motor do desmatamento no Brasil, sua equipe começou a focar na cadeia de fornecimento de carne bovina. Seu trabalho passou a ser reconhecido por ONGs internacionais como um dos sistemas de rastreamento mais sofisticados de gado e desmatamento no país.

Em 2020, a ONG internacional Mighty Earth entrou em contato com Gomes enquanto conduzia pesquisas para uma campanha sobre a carne bovina brasileira fornecida a supermercados europeus. Após ele apresentar um plano detalhado sobre como expor as ligações entre a carne bovina da JBS e o desmatamento nos três principais biomas brasileiros, a Mighty Earth e a Repórter Brasil se uniram para dar início a essa investigação.

Nos seis meses seguintes, Gomes coordenou a investigação dos dados do rastreamento de produtos no Brasil e na Europa. Ele montou uma equipe de pesquisadores independentes em quatro países europeus, cuja tarefa era visitar vários supermercados e encontrar produtos de carne específicos fornecidos pela JBS, como a carne enlatada ou a carne seca da Jack Link’s. Os pesquisadores então enviavam uma foto do número de rastreamento padrão de exportação do produto do Brasil. A equipe de Marcel rastreou meticulosamente cada passo, data da visita, endereço do supermercado e localização do produto.

Uma vez que Gomes e sua equipe tinham acesso ao número de rastreamento, eles rastreavam a carne ao longo da cadeia de fornecimento, desde o frigorífico até o matadouro e, por fim, até a fazenda onde o gado era criado. Se a fazenda identificada tinha sido sancionada anteriormente por desmatamento, sua equipe trabalhava com trabalhadores rurais para corroborar os dados e obter mais informações. Depois que as fazendas eram identificadas, Marcel compartilhava as localizações com a equipe de mapeamento por satélite da Mighty Earth, que sobrepunha imagens tiradas todos os anos para medir o desmatamento nas proximidades de cada fazenda.

Em meados de 2021, com as evidências em mãos, Gomes entrou em contato com os frigoríficos e fornecedores implicados na investigação, enquanto a Mighty Earth comunicava-se diretamente com os supermercados, que não contestaram os fatos descobertos na investigação da Repórter Brasil e, diante de uma possível reação pública negativa, concordaram em anunciar boicotes em conjunto com a publicação do relatório. Enquanto isso, Marcel trabalhou com uma equipe jurídica para se preparar para a reação da JBS antes da publicação. Apesar de receber advertências dos executivos da JBS para não publicar a investigação, ele não recuou.

Em 15 de dezembro de 2021, seis grandes redes de supermercados europeus, representando mais de US$ 30 bilhões em vendas no varejo em quatro países (Sainsbury’s no Reino Unido, Albert Heijn e Lidl na Holanda, Carrefour e Delhaize na Bélgica e Auchan na França), comprometeram-se a parar de vender produtos de carne bovina da JBS e, em alguns casos, todos os produtos de carne provenientes do Brasil. Eles fizeram seus anúncios após a publicação da investigação, que demonstrou que a carne da JBS era proveniente de fazendas responsáveis pelo desmatamento na Amazônia, no Cerrado e no Pantanal.

Gomes e sua equipe se especializaram em uma combinação única de jornalismo investigativo e com redes de informação no campo para expor crimes ambientais e de direitos humanos e, dessa forma, gerar transparência nas cadeias de suprimentos das indústrias brasileiras para mudanças positivas.

Desde a publicação do relatório, a pressão sobre a JBS continuou a aumentar. Em 2022, a empresa varejista alemã Metro Germany, com mais de US$ 20 bilhões em vendas anuais, suspendeu todos os produtos de carne da JBS até nova ordem. Uma investigação separada de 2022 sobre lavagem de gado, coordenada por Marcel, levou a JBS a admitir publicamente que havia comprado quase 9000 cabeças de gado criadas em áreas desmatadas ilegalmente de 2018 a 2022. Apesar das investigações, a JBS afirma que está buscando eliminar o desmatamento ilegal de sua cadeia de fornecimento de gado para 2025 na Amazônia, e até 2030 em todos os outros biomas brasileiros.

Confira abaixo todos os vencedores do Prêmio Goldman de Meio Ambiente de 2024:

ÁFRICA
Nonhle Mbuthuma e Sinegugu Zukulu, África do Sul

Em setembro de 2022, os ativistas indígenas Nonhle Mbuthuma e Sinegugu Zukulu conseguiram impedir a realização de testes sísmicos para exploração de petróleo e gás na Costa Selvagem, localizada no Cabo Oriental da África do Sul. Após mobilizarem sua comunidade, Nonhle e Sinegugu alcançaram uma vitória importante, garantindo os direitos da comunidade local de proteger seu ambiente marinho. Ao bloquear a exploração de petróleo e gás em uma região de rica biodiversidade, eles salvaguardaram as baleias migratórias, golfinhos e outras espécies selvagens dos impactos adversos dos testes sísmicos.

ÁSIA
Alok Shukla, Índia

Alok Shukla liderou com sucesso uma campanha de resistência comunitária que protegeu 180.085 hectares de florestas ricas em biodiversidade de 21 minas de carvão planejadas no estado de Chhattisgarh, na Índia Central. Em julho de 2022, o governo cancelou os planos para as 21 minas de carvão em Hasdeo Aranya. Reconhecida como os “pulmões de Chhattisgarh”, essa região representa uma das maiores áreas florestais intactas da Índia.

EUROPA
Teresa Vicente, Espanha

Teresa Vicente liderou uma campanha comunitária e histórica para preservar o ecossistema do Mar Menor, a maior lagoa de água salgada da Europa, que estava à beira do colapso. Em setembro de 2022, foi aprovada uma nova lei que confere à lagoa direitos legais exclusivos. Reconhecido como o mais importante corpo costeiro de água salgada do Mediterrâneo Ocidental, o Mar Menor sofreu uma significativa poluição devido à mineração, ao crescimento descontrolado de infraestrutura urbana e turística, e mais recentemente, à agricultura e pecuária intensivas.

ILHAS E PAÍSES INSULARES
Murrawah Maroochy Johnson, Austrália

Murrawah Maroochy Johnson impediu o desenvolvimento da mina de carvão Waratah em Queensland, que teria contribuído significativamente para a mudança climática, destruído o Refúgio Natural Bimblebox de quase 8.094 hectares, liberado 1,58 bilhão de toneladas de CO2 durante sua operação e ameaçado os direitos e a cultura indígena. A vitória de Murrawah em uma apelação em 2023 criou um precedente importante, possibilitando que outros povos das Primeiras Nações contestem projetos de carvão ao associar a mudança climática aos direitos humanos e indígenas.

AMÉRICA DO NORTE
Andrea Vidaurre, Estados Unidos

Sob a liderança comunitária de Andrea Vidaurre, o Conselho de Recursos Aéreos da Califórnia adotou, na primavera de 2023, duas regulamentações de transporte inovadoras que limitam significativamente as emissões de caminhões e trens. As novas regulamentações, denominadas In-Use Locomotive Rule (Regra de Locomotivas em Uso) e California Advanced Clean Fleets Rule (Regra de Frotas Limpas Avançadas da Califórnia), estabelecem a primeira norma nacional de emissões para trens e um plano para alcançar 100% de emissões zero em vendas de caminhões de carga até 2036. Essas medidas, resultado do trabalho político de Andrea e da mobilização comunitária, prometem melhorar significativamente a qualidade do ar para milhões de californianos e acelerar a transição do país para veículos de emissão zero.

AMÉRICA DO SUL E AMÉRICA CENTRAL
Marcel Gomes, Brasil

Marcel Gomes coordenou uma investigação jornalística internacional complexa que vinculou a carne vendida pela JBS em supermercados europeus ao desmatamento ilegal na Amazônia, no Cerrado e no Pantanal. Com base nas evidências dessa investigação, Gomes e sua equipe da Repórter Brasil trabalharam com parceiros para pressionar varejistas globais a parar de vender a carne de origem ilegal, levando seis grandes redes de supermercados europeus na Bélgica, na França, na Holanda e no Reino Unido, que juntas somavam mais de US$ 30 bilhões em vendas, a suspender indefinidamente a venda de produtos da JBS em dezembro de 2021.

Fonte: Guia Região dos Lagos

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