Economia indígena cria modelos de negócios sustentáveis
A bioeconomia tem chamado cada vez mais a atenção dos mercados que buscam se adaptar a um modelo de negócio sustentável e coerente, levando em consideração as demandas de recursos naturais, justiça social e bem-estar para as sociedades. No entanto, para muitos pensadores indígenas, o que hoje é chamado de bioeconomia são práticas culturais milenares dos povos originários, que têm relações intrínsecas com a natureza por meio de seus modos de vida.
As relações de observação e respeito ao meio ambiente são urgentemente necessárias para mudar os rumos de uma economia exploratória que está levando o planeta ao colapso climático. Atualmente, as grandes inovações nos mercados ocorrem por meio de parcerias com produtores tradicionais, que manejam e extraem diversos produtos, enquanto conservam as Áreas Protegidas, fazendo a vigilância dos territórios e prestando serviços socioambientais de impacto global.
No entanto, para que essas relações impactem de fato os modelos de negócios e promovam uma transição em escala para uma economia sustentável, é necessário escutar e aprender com os povos indígenas. A economia indígena é indissociável das rotinas e culturas que ocorrem nas aldeias. Um grande problema que impede o reconhecimento da qualidade dos trabalhos indígenas é a invisibilidade de seus povos.
André Fernando Baniwa, liderança Baniwa, atual Coordenador-Geral de Promoção à Cidadania, no Departamento de Promoção da Política Indigenista, órgão ligado à Secretaria Nacional de Articulação e Promoção de Direitos Indígenas do Ministério dos Povos Indígenas, e Vice-Presidente da OIBI, organização comunitária membro da rede Origens Brasil, relata: “Quando você fala de trabalho indígena, vai encontrar vários níveis de invisibilidade. A gente faz trabalho nas comunidades, de construção, de casa, de fabricação de beiju, farinha, tapioca, trabalho de construir roça, plantar, colher, todo o processamento de mandioca, de caça, de pesca, tudo isso é invisível. E por ser invisível, as pessoas que vivem de contrato acham que a gente não faz nada e acham que a gente é preguiçoso, que não contribui com nada… No caso da economia indígena propriamente dita, é sobre segurança alimentar, recurso pesqueiro, de fauna e flora, sistema agrícola tradicional, tudo isso é economia indígena.”
Cada povo e comunidade indígena tem sua maneira de praticar economia. No Brasil, contamos com a diversidade de 305 etnias, falantes de mais de 270 línguas. Isso significa que há muita pluralidade de pensamento e conhecimento. Setenta e sete etnias indígenas da Amazônia fazem parte da rede Origens Brasil e representam 65% dos produtores cadastrados, sendo responsáveis pela conservação das áreas protegidas e pela produção de diversos produtos.
Lana Paiter Suruí, representante das artesãs da cooperativa Coopaiter, destaca a importância de se respeitar a natureza e valorizar o trabalho indígena: “Quando minha avó ia buscar os insumos do cesto, ela não pegava qualquer folha para tirar. Ela olhava, via a que dava certo e tirava, não é assim só pegar, porque tira a rotina da folha e estraga. Então tem que saber lidar com aquilo que a natureza oferece e que a gente pega da natureza. A gente não pode invadir, antecipar a natureza. O que a natureza oferece está lá prontinho, a gente pega, se não deixa lá quieto. Tudo isso tem um trabalho de muita importância, que vem passando de geração em geração para nós.”
A economia indígena, em suas diversas expressões, se sustenta há muitas gerações por conta de suas tecnologias sociais e ambientais. Com base em modos de vida organizados, cada interação social e com o meio ambiente fortalece saberes e inteligências que funcionam como soluções para o bem-estar de cada pessoa, da comunidade e da floresta. No entanto, a invisibilidade dos povos indígenas dificulta sua inserção nos mercados.
As comunidades indígenas estão buscando o fortalecimento de suas capacidades para adequar seus produtos às exigências de qualidade do mercado e estão estruturando as cadeias de produção, com o apoio das instituições. No catálogo lançado pelas artesãs indígenas do Tupi Guaporé, localizadas nos estados de Rondônia e Mato Grosso, é possível ver dezenas de opções de biojoias, produtos de tecelagem, fibras naturais e cerâmicas que representam a cultura de seus povos e os serviços socioambientais decorrentes de seus modos de vida.
É essencial fomentar parcerias comerciais éticas com os povos da floresta. Empresas, empresários e investidores devem se sensibilizar para um novo modelo de negócio que coloque a floresta em primeiro lugar. Os povos indígenas já vivem a solução para o enfrentamento das mudanças climáticas: produzir ao mesmo tempo em que se conserva e respeita o meio ambiente.
André Baniwa destaca a importância de encontrar investidores que apostem em novas soluções: “Os indígenas já têm potencial e têm muitas iniciativas relacionadas a isso. É preciso encontrar investimento para organização, é somente assim que a gente tem conseguido também para chamar atenção, mas sempre com muita determinação de manter a diferença, a especificidade, o conceito próprio e a lógica própria, para tentar influenciar positivamente outras iniciativas.”
A economia indígena não é apenas uma alternativa sustentável, mas uma oportunidade de valorizar a ancestralidade, os saberes tradicionais e a conservação da natureza. É fundamental reconhecer e apoiar esses modelos de negócio, pois eles representam a construção de um futuro mais justo e equilibrado para todos.