COP16 precisa liberar recursos para a biodiversidade

COP 16 Biodiversidade Colômbia

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A Conferência das Partes sobre Biodiversidade (COP16) em Cali, Colômbia

Ministra Susana Muhamad discursa na COP16 sobre biodiversidade
A ministra do Meio Ambiente da Colômbia, Susana Muhamad, discursa na abertura da 16ª reunião da Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica (COP16) em 21 de outubro de 2024. Foto: © ONU Biodiversidade

Neste mês de outubro, especificamente no dia 21, teve início em Cali, Colômbia, a 16ª reunião da Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica (COP16), reunindo representantes de mais de 190 nações. Com término planejado para o dia 1º de novembro, esta conferência já é considerada a mais significativa na história dedicada à biodiversidade, contando com aproximadamente 20 mil participantes, conforme estimativas oficiais do governo colombiano.

Durante este evento, diversas nações revisarão a implementação do Marco Global de Biodiversidade de Kunming-Montreal, em sua primeira análise desde a sua adoção em dezembro de 2022.

É esperado que cada país apresente como suas Estratégias e Planos de Ação Nacionais para a Biodiversidade (EPANBs) estejam em conformidade com o Marco Global. Contudo, durante a primeira semana da COP16, notou-se um “calote generalizado”, onde muitos planejamentos nacionais, as NBSAPs, estavam ausentes. As delegações do Reino Unido e da Alemanha, que são incisivas na cobrança por um maior compromisso nas negociações ambientais, foram notadas por não cumprirem o prazo estipulado.

Biodiversidade Amazônica
Foto: Wikimedia Commons – Especiaria ameaçada na Amazônia

A Colômbia foi a anfitriã da conferência apresentando sua NBSAP logo no início da COP, enquanto o Brasil revelou preliminarmente algumas informações sobre o desenvolvimento de seu compromisso. Nos encontros, o Brasil também tem enfatizado uma questão crucial que está ausente: a formação de recursos financeiros. É vital não apenas expor os Planos de Ação, mas também especificar quais serão os fundos necessários para alcançar as metas propostas, o que se destacou como um grande desafio.

Durante a COP15, que ocorreu em Montreal, foi estabelecido o Fundo do Quadro Global para a Biodiversidade, que prevê um compromisso coletivo de arrecadar, até 2030, pelo menos US$ 200 bilhões anuais voltados para ações de preservação da biodiversidade. Desse total, US$ 20 bilhões devem vir dos países do Norte Global até 2025, destinados aos países do Sul.

Entretanto, a realidade está bem aquém desse objetivo. Um recente relatório da OCDE revela que o investimento em biodiversidade aumentou entre 2015 e 2022, alcançando aproximadamente US$ 15,4 bilhões.

Com isso, o volume ainda representa apenas 15% da meta de US$ 200 bilhões anualmente até 2030. Essa informação foi divulgada na COP16 durante a sessão intitulada Mobilizando Bilhões: Caminhos para Alcançar o Quadro Global da Biodiversidade.

Ane Alencar, diretora de Ciência do IPAM, ressaltou na conferência que o financiamento é uma peça fundamental e essencial para a conservação da biodiversidade. “Estamos falando de uma das maiores riquezas do mundo. A Amazônia é um dos locais com mais biodiversidade do planeta, com novas espécies descobertas a cada dois dias”, afirmou.

Expectativa e Realidade do Financiamento

O climatologista Carlos Nobre, parte da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza e investigador no Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (USP), declarou sua expectativa de que o fundo global da biodiversidade, instaurado na COP15, receba designação de pelo menos US$ 100 bilhões por ano.

Imagem representando a vida financeira sustentável
Foto: Michele Henderson | Unsplash – Ação e conservação sustentável

Ele acredita que esse montante mínimo é necessário para preservar a biodiversidade, especialmente nas áreas mais ameaçadas. O pesquisador pede maior atenção à Amazônia, que pode entrar em colapso até 2050 se a degradação continuar nesse ritmo. Para promover a mudança, é fundamental não apenas garantir a alocação dos recursos, mas também apoiar comunidades tradicionais, que desempenham um papel crucial na conservação da floresta, incluindo povos indígenas, quilombolas e ribeirinhos. “Esperamos que ao final desta COP possamos ter boas notícias”, complementa Nobre.

Os povos indígenas, reconhecidos por sua importância na preservação de 30% das terras e dos oceanos até 2030, pedem principalmente o fim do uso de combustíveis fósseis. O G9, uma coalizão de organizações indígenas dos nove países amazônicos, trouxe essa exigência como uma prioridade durante a COP16.

Cerimônia de abertura da COP16 com indígenas
Cerimônia de abertura da Conferência de Biodiversidade das Nações Unidas (COP16) em Cali, na Colômbia, em 21 de outubro de 2024. Foto: © ONU Biodiversidade

Kleber Karipuna, líder indígena do povo Karipuna e coordenador executivo da APIB (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil), salientou o papel dos povos tradicionais na conservação e a falta de financiamento que chega até eles. “A proposta central desta COP é paz com a natureza. Nós, povos indígenas, já vivemos em harmonia com a natureza”, declarou Karipuna. “No entanto, o apoio financeiro se destina principalmente a grandes empresas que promovem a degradação da biodiversidade. Precisamos reavaliar essa dinâmica. Confiem e apoiem os povos indígenas”.

Karipuna também enfatizou a importância de garantir que o financiamento direto chegue às comunidades originárias, além de amplificar os mecanismos que já existem para a gestão financeira indígena, contribuindo assim para fortalecer as estratégias de conservação que essas comunidades praticam.

A conferência também está reconhecendo formalmente a contribuição de povos tradicionais que cuidam da natureza com seus modos de vida, sendo a inclusão explícita de populações tradicionais afrodescendentes uma iniciativa que partiu de Colômbia e Brasil, onde há muitos grupos negros com modos de vida tradicionais.

Quilombolas em ação no Vale do Ribeira
Preta, enquanto limpa sementes no Quilombo Nhunguara. Foto: Bianca Tozato | ISA – Trabalho sustentável em comunidades quilombolas

Em relação ao financiamento para a biodiversidade, Kumi Kitamori, diretora-adjunta de Meio Ambiente da OCDE, declarou que os países precisam dar o exemplo através de metas ambiciosas relacionadas à biodiversidade e alinhar seus orçamentos com estas metas. “Menos de 2% dos orçamentos públicos nacionais são direcionados a atividades de biodiversidade em diferentes países”, informou.

Ela acredita que os governos também podem mobilizar investimento privado ao reduzir os riscos desses investimentos e emitir sinais políticos claros, facilitando assim que o setor privado tome decisões acertadas. Além disso, incentivos à biodiversidade como impostos e pagamentos por serviços ecossistêmicos podem ser aplicados para direcionar as ações de setores privados e prevenir atividades lesivas ao meio ambiente.

Marcha pelo Clima no Rio de Janeiro
A Marcha pelo Clima é parte do Ato Global pelo Clima, realizado em diversas cidades do mundo, com alertas sobre a crise climática. Foto: Fernando Frazão | Agência Brasil

No entanto, após uma semana de intenso debate, os países ainda não conseguiram progredir na definição de um modelo claro de financiamento para a conservação da biodiversidade, um aspecto crucial para o cumprimento das metas globais estabelecidas em 2022.

Até o momento, apenas US$ 200 milhões foram mobilizados, um valor irrisório comparado aos US$ 200 bilhões anuais que é necessário até 2030. Além disso, espera-se que dos US$ 200 bilhões, US$ 20 bilhões sejam doados anualmente aos países em desenvolvimento até 2025, e nesse aspecto também não houve avanço.

A análise dos instrumentos financeiros e econômicos para a biodiversidade pela OCDE revela que os impostos que envolvem biodiversidade arrecadam cerca de US$ 11 bilhões por ano nos países monitorados. Apesar de parecer significativo, isso ainda representa uma pequena fração, apenas 1,3%, da receita pública total relacionada ao meio ambiente coletada pelos governos em todo o mundo.

A Interligação entre Biodiversidade e Mudanças Climáticas

Essa conferência se destaca não apenas pela urgência em estabelecer compromissos robustos para conter a possível extinção de até um milhão de espécies ao redor do planeta, mas também pela interconexão temática com a emergência climática. Segundo Carlos Nobre, “a biodiversidade e o clima estão intrinsecamente ligados. É imprescindível abordar a crise climática para preservar a biodiversidade e, ao mesmo tempo, garantir que os ecossistemas continuem saudáveis para enfrentar os desafios climáticos”.

Mudanças climáticas e sua relação com a biodiversidade
As mudanças climáticas estão causando eventos extremos pelo planeta. | Foto: Patrick Perkins | Unsplash

Nobre destaca que os ecossistemas naturais desempenham um papel crucial na eliminação significativa de gases de efeito estufa na atmosfera. “Todas as florestas e ecossistemas tanto terrestres quanto marinhos são responsáveis por remover até 33% do dióxido de carbono (CO2) produzido pelas atividades humanas”, enfatiza.

Ele acredita que os resultados do COP16 sobre a biodiversidade devem “transmitir mensagens” para a COP 29 de clima, programada para ocorrer entre os dias 11 e 22 de novembro, em Baku, Azerbaijão. “Esses eventos são muito interligados”, acrescenta Nobre.

“Enquanto os governos continuam optando por metas insuficientes e financiamentos que não se concretizam, nós queremos afirmar que não podemos ter paz com a natureza sem declarar, de forma transparente, a guerra contra combustíveis fósseis e quaisquer projetos destrutivos que ameaçam a vida no planeta”, afirma o Manifesto da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab).

Marcha pelo Clima em Rio de Janeiro
Manifestantes na Marcha pelo Clima, realizada no dia 21 de setembro, no Rio de Janeiro, clamando por ações climáticas. Foto: Fernando Frazão | Agência Brasil

A transição energética justa é essencial tanto para preservar o clima quanto para interromper a perda de biodiversidade. Em resposta, organizações da América Latina têm promovido uma agenda que enfoca um papel central da região e que poderia, a longo prazo, assegurar um desenvolvimento sustentável. Essa mobilização resultou na formação da Aliança Potência Energética (APEL) em 2024, unindo diferentes instituições em prol do fortalecimento de comunidades locais.

Questões sobre Dados Genéticos

Outro assunto que a COP16 objetiva abordar é o mecanismo multilateral para o compartilhamento justo e equitativo dos benefícios derivados do uso de informações digitais sobre sequências de recursos genéticos. É fundamental assegurar que o acesso à biodiversidade permita proteção, conhecimento e repartição adequada dos benefícios com as comunidades tradicionais que possuem o saber sobre esses recursos.

Sequência genética e biopirataria
Foto: digitale.de na Unsplash – Exploração de dados genéticos e suas implicações éticas

Em 2022, a CBD já havia estabelecido um mecanismo global para repartição dos benefícios do uso das informações sobre sequências genéticas digitais (DSI). A COP16 precisa agora definir como serão calculados e financiados esses benefícios. Este assunto é visto como uma das discussões mais complexas na cúpula, envolvendo questões de biopirataria e somas consideráveis.

Todas as discussões anteriores focaram em recursos in natura e, com a introdução do sequenciamento digital, novas considerações surgem, especialmente para o Brasil. A questão dos DSI afeta diretamente outros tratados, que vão desde segurança alimentar a riscos sanitários, mas até agora nenhuma menção foi feita sobre o sequenciamento genético, que apresenta lacunas na implementação do Protocolo de Nagoya.

Com informações de ClimaInfo, WWF, IPAM, Rede de Especialistas em Conservação da Natureza e da ONU.

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