Comunidade isolada produz sua própria energia solar no Amazonas

Vila Limeira

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A Vila Limeira, um Exemplo de Transição Energética Sustentável no Amazonas

Comércio na Vila Limeira
Imagem da Vila Limeira, comunidade que adota energia solar. Foto: Jenifer Veloso | Charles Stuart Mott Foundation

A transição para uma energia limpa e acessível já é uma realidade na Vila Limeira, uma comunidade de 90 habitantes situada às margens do Rio Purus, a 853 km de distância de Manaus, no estado do Amazonas. Com a implementação de uma minirrede de energia solar fotovoltaica, a Vila Limeira tornou-se referência na região, sendo reconhecida como a primeira comunidade do sul do Amazonas a contar com energia 100% solar. Essa transformação tem trazido impactos significativos no desenvolvimento social e econômico dos moradores.

Anteriormente, a comunidade dependia de um gerador a diesel que fornecia apenas três horas diárias de energia. Hoje, os residentes desfrutam de um fornecimento contínuo de energia, 24 horas por dia, tanto em suas casas quanto nas ruas da vila. Essa mudança trouxe melhorias notáveis, como iluminação noturna constante e a possibilidade de conservar alimentos em geladeiras, eliminando a necessidade de grandes quantidades de sal para preservação. Além disso, a energia solar abriu oportunidades para maiores investimentos em educação, com muitos jovens conseguindo cursar a faculdade à distância.

Vila Limeira
Imagem da energia solar instalada na comunidade. Foto: Jenifer Veloso | Charles Stuart Mott Foundation

O professor Aldo Junior Oliveira de Godoy destaca que, atualmente, oito cidadãos da comunidade estão matriculados em cursos superiores, divididos entre quatro homens e quatro mulheres, todos provenientes da escola comunitária local. Para o pastor Gilase Oliveira, a energia tem servido como um canal para o desenvolvimento, uma mudança significativa em relação ao passado, quando as famílias gastavam R$ 5 mil anualmente para obter eletricidade de um gerador, agora reduzido para apenas R$ 720 por ano. Os moradores depositam essa quantia em um fundo comunitário que visa a manutenção e expansão da própria rede elétrica.

O projeto que tornou a Vila Limeira um modelo de sustentabilidade surgiu de uma parceria entre a Apavil – Associação dos Moradores da Vila Limeira e o WWF-Brasil, com apoio da Fundação Charles Stewart Mott e autorização do ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade). A usina solar foi oficialmente inaugurada em agosto de 2021.

Vila Limeira
Energia solar permitindo a utilização de eletrodomésticos na comunidade. Foto: Jenifer Veloso | Charles Stuart Mott Foundation

Na Vila Limeira, as construções, a escola, o centro comunitário e as atividades produtivas estão concentrados em um espaço reduzido. Por essa razão, foi projetada e implementada uma minirrede off-grid, conhecida no Brasil como Microssistema Isolado de Geração e Distribuição de Energia Elétrica (MIGDI). Com a análise das demandas energéticas da localidade, foi decidido que uma usina solar de 30kWp seria suficiente para atender às necessidades da comunidade. O sistema foi concebido com tecnologia de ponta, incluindo baterias de lítio que têm uma vida útil de 15 anos e medidores digitais individuais em cada unidade consumidora.

O engenheiro Aurélio Souza, responsável pelo projeto da minirrede da Vila Limeira, apontou que o sistema foi desenvolvido levando em consideração a demanda do momento, mas sempre com uma margem de segurança para o futuro, tendo em vista o crescimento potencial da comunidade e a necessidade real de energia.

“Sabemos que existe um grande desejo por eletrodomésticos. Ao planejar a capacidade do sistema em Vila Limeira, realizamos um levantamento das cargas existentes e fizemos projeções de crescimento. Três anos depois, o sistema ainda atenderá a demanda e todos têm eletrodomésticos em casa”, afirmou Souza.

Vila Limeira
Vila Limeira após a instalação do sistema solar, a comunidade se modernizou. Foto: Jenifer Veloso | Charles Stuart Mott Foundation

A experiência em Vila Limeira ilustra como a energia solar pode ser uma alternativa viável para comunidades que ainda não estão conectadas à rede elétrica nacional. De acordo com um estudo do Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA), seria necessário um investimento entre R$ 7,2 bilhões e R$ 38 bilhões para atender o Programa Luz para Todos (LpT), que visa levar energia elétrica a quase um milhão de pessoas que vivem sem eletricidade na Amazônia Legal.

Conforme enfatizou Alessandra Mathyas, analista de conservação do WWF-Brasil, o sucesso da Vila Limeira pode servir como modelo para as comunidades isoladas na floresta. “Esse modelo pode ser expandido, respeitando as características dos diferentes territórios, sem a necessidade de grandes alterações nas estruturas das comunidades, principalmente onde a vida social é muito próxima”, destacou.

A energia solar transformando a vida na comunidade
Transformações na comunidade após a implementação da energia solar. Foto: Jenifer Veloso | Charles Stuart Mott Foundation

Desde a instalação do sistema em 2021, a Vila Limeira passou de 20 famílias e 80 habitantes para 25 famílias, com um aumento de aproximadamente 30% no número de residentes. A fundação da comunidade remonta a 1958, quando três irmãos deixaram a Paraíba e se estabeleceram na região, contribuindo para a formação da mão de obra dos seringais. Atualmente, a população é composta por descendentes desses pioneiros e por novas famílias que têm se unido à comunidade ao longo dos anos.

Historicamente, a vila baseava sua economia na agricultura de subsistência, com produção de mandioca, açaí e castanha. Com a nova realidade energética, estão se organizando para recuperar áreas degradadas e experimentar sistemas agroflorestais, plantando novamente açaí e outras espécies nativas. Para isso, estão implementando viveiros de mudas destinados à própria comunidade e aos vizinhos.

Com as novas condições proporcionadas pela energia solar, a comunidade desenvolveu novos planos visando ao progresso social e econômico. A comunidade tem como objetivo aumentar a capacidade de geração de energia solar, dobrando o número de módulos solares e expandindo suas atividades produtivas, especialmente a produção de açaí, que atualmente é de cinco toneladas anuais. O objetivo é elevar essa produção para 60 toneladas por ano, incluindo colaborações com comunidades vizinhas.

Vila Limeira e as novas plantações
Novas perspectivas de cultivo na comunidade com a energia solar. Foto: Jenifer Veloso | Charles Stuart Mott Foundation

“Já plantamos 40 mil mudas de açaí, andiroba e ingá em um sistema agroflorestal, com o intuito de restaurar áreas de pastagem que acabaram sendo degradadas por práticas inadequadas. Agora estamos focados na recuperação da terra e na implementação de práticas sustentáveis”, diz Gilase, um dos líderes da comunidade.

A participação da comunidade em todo o processo, desde a instalação até a manutenção do sistema, foi fundamental para o sucesso do projeto. Moradores foram responsáveis pela construção da infraestrutura e foram capacitados para realizar a manutenção da usina, incluindo o monitoramento da geração e consumo de energia. “Acompanhar e entender o quanto geramos e consumimos é essencial para a sustentabilidade e bem-estar de todos”, afirma Gilase.

Controles da usina solar
Equipamentos na casa de controle da usina solar. Foto: Jenifer Veloso | Charles Stuart Mott Foundation

A gestão da minirrede ficou sob a responsabilidade de dois moradores, que participaram de todo o processo de instalação e foram treinados para realizar as manutenções necessárias. A usina solar contém uma casa de controle, onde os equipamentos estão centralizados, longe de possíveis alagamentos. “Era um sonho que sabíamos que seria desafiador. Hoje, estamos vendo esse sonho se concretizar, com a colaboração de toda a comunidade e de nossos parceiros. Temos novos projetos que visam melhorar a qualidade de vida de todos”, conclui Jonas Nogueira de Oliveira, um dos responsáveis pela gestão e manutenção do sistema solar em Vila Limeira.

Energia solar como solução
Imagem representativa da energia solar como alternativa sustentável. Foto: torstensimon | Pixabay

A localização da Vila Limeira apresenta desafios logísticos, como ocorre com outras comunidades dentro da Reserva Extrativista Médio Purus. O acesso se dá, em média, por uma viagem de 8 horas de lancha a partir da cidade de Boca do Acre, podendo chegar a 15 horas no período de seca. Na reserva, 89 comunidades já têm energia do Programa Luz Para Todos, mas nove ainda dependem do gerador a diesel, uma fonte de energia poluente.

Desafios e Mudanças no Fornecimento de Energia no Amazonas

Atualmente, o fornecimento de energia no Amazonas enfrenta sérios problemas. Nos 62 municípios do estado, há constante falta de eletricidade, afetando particularmente áreas rurais, terras indígenas e unidades de conservação. Em 12 de junho deste ano, o governo federal editou a Medida Provisória 1.232, que proporciona a troca de comando da concessionária Amazonas Energia, que se encontra em dificuldades financeiras. A nova gestão terá como responsabilidade realizar um levantamento sistemático das necessidades energéticas das localidades isoladas.

A nova empresa deverá desenvolver um Plano de Ação Multidisciplinar que visa reduzir os custos da Conta de Consumo de Combustíveis Fósseis, implementando ações para eficiência e inclusão energética no Amazonas, envolvendo as comunidades locais em seu planejamento.

Este contexto ressalta a importância de iniciativas como a da Vila Limeira, que não apenas promovem a inclusão social e energética, mas também destacam a viabilidade de soluções sustentáveis e adaptáveis às realidades locais. A experiência da comunidade prova que a energia solar pode ser um caminho eficaz para o desenvolvimento de áreas remotas, garantindo autonomia e qualidade de vida a seus moradores.

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