As cidades costeiras são essenciais para a economia mundial, desempenhando funções cruciais nas esferas econômica, social e ambiental da sociedade. Assim, estas cidades estão expostas a eventos climáticos severos, como furacões e tsunamis, além de serem especialmente vulneráveis ao aumento do nível do mar. Diante dessa realidade, um grupo de pesquisa internacional se dedicou a analisar como essas localidades se adaptam às mudanças climáticas.
Coordena este estudo o geógrafo Matthias Garschagen, da Universidade Luís Maximiliano de Munique, na Alemanha, que avaliou um total de 199 cidades em 54 países, incluindo o Brasil. O objetivo da pesquisa foi examinar se e como as áreas costeiras estão considerando diversos fatores de risco em suas estratégias de adaptação. Entre os principais elementos considerados estão o aumento do nível do mar, tempestades, inundações e ondas de calor. Além disso, o estudo analisou a vulnerabilidade da população, a infraestrutura das cidades e os ecossistemas locais.
Desafios nas adaptações climáticas
A investigação revelou que a maioria das iniciativas destinadas a adaptação às mudanças climáticas foca principalmente na elevação do nível do mar, inundações e, em menor grau, em tempestades, ciclones e erosão. Tais medidas técnicas e institucional, como a construção de diques em larga escala e inovações no planejamento urbano, são mais prevalentes em regiões ricas, como América do Norte e Europa.
O estudo identificou áreas que demonstram uma adaptação significativa, especialmente em economias desenvolvidas e pequenos estados insulares. Cidades como Singapura, Hong Kong e diversas localidades na Suécia estão investindo em infraestrutura adaptativa, abordagens de prevenção e recuperação, além de práticas que respeitam os ecossistemas locais. Avanços no planejamento urbano e na criação de novas legislações também refletem essa mudança em busca de uma adaptação mais robusta.
Além disso, há exemplos intermediários de adaptações em países como os Países Baixos (com cidades como Dordrecht e Roterdão) e na Finlândia (Helsinque), assim como em países asiáticos de renda média. A única cidade com baixa renda na amostra, que demonstrou um nível médio de adaptação, foi Maputo, em Moçambique, que incorporou medidas de adaptação em seus planos de desenvolvimento e definiu responsabilidades claras para enfrentar os impactos climáticos.
Entretanto, a pesquisa abordou a realidade de que muitas medidas de adaptação adotadas mundialmente são insuficientes, tanto em profundidade como em escopo e velocidade, independentemente da riqueza das regiões. As evidências sobre a redução do risco como resultado dessas ações foram escassas, segundo os pesquisadores.
“Nossos achados indicam que ainda existe um caminho significativo a percorrer em todos os níveis”, afirma Garschagen. “Houve pouco progresso real e duradouro que envolvesse uma reavaliação abrangente da gestão de riscos. Muitas cidades parecem tentar otimizar suas gestões de desastres com base em experiências passadas, sem questionar se essas abordagens serão eficazes no futuro”, completa.
A cidade de Ho Chi Minh, no Vietnã, é um exemplo de vulnerabilidade, pois está se expandindo rapidamente em áreas propensas à inundação, com novas infraestruturas que poderão ser afetadas por futuras catástrofes em um horizonte de 60 a 70 anos. “Essa situação é extremamente arriscada”, alerta o geógrafo.
A importância de dados adequados
A pesquisa também indicou que é incomum que os planos de adaptação se baseiem em dados mensuráveis. Embora os riscos naturais, como inundações e calor, sejam frequentemente considerados, fatores socioeconômicos, como a vulnerabilidade social futura ou o crescimento urbano, raramente entram na equação das decisões de adaptação.
“Essas tendências são fundamentais”, destaca Garschagen. “O que é Lagos ou Jacarta hoje não será o mesmo que daqui 20 anos. Portanto, é crucial desenvolver melhores cenários e métodos de modelagem. Além disso, precisamos discutir seriamente quando pode ser mais sensato abandonar as estruturas de proteção costeira e considerar o reassentamento populacional”, conclui.
Por fim, a pesquisa aponta uma distribuição desigual do conhecimento sobre as adapções. Muitos estudos concentram-se em cidades localizadas no hemisfério norte, enquanto as cidades do hemisfério sul recebem significativamente menos atenção na pesquisa. “Uma pesquisa global sobre mudanças climáticas que abranja todas as regiões do mundo seria fundamental para um combate mais eficaz e acelerado à crise climática”, afirma Garschagen. O estudo foi publicado em inglês na Nature Cities.