Amazônia e seu papel no clima do planeta: conheça a máquina de chuva

formação de chuvas na Amazônia

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Estudo revela o complexo mecanismo de formação de chuvas na Amazônia

formação de chuvas na Amazônia durante pesquisa aérea
Nuvens sobre a bacia amazônica em foto tirada durante um voo de pesquisa. Foto: Philip Holzbeck | Instituto de Química Max Planck

Pesquisadores de um grupo internacional, incluindo profissionais brasileiros, conseguiram, pela primeira vez, desvendar o intricado mecanismo físico-químico responsável pela formação das chuvas na Amazônia, que possui impacto no clima mundial. O estudo revela que isso envolve a criação de nanopartículas de aerossóis, descargas elétricas e reações químicas que ocorrem em altitudes elevadas, entre a noite e o dia, resultando em uma autêntica “máquina” geradora de nuvens.

A pesquisa, publicada na prestigiada revista Nature, analisa o transporte do isopreno, um gás liberado pela vegetação através de seu metabolismo, até a camada atmosférica próxima da tropopausa durante tempestades noturnas. As reações químicas, desencadeadas pela radiação solar, resultam em uma grande produção de aerossóis que são fundamentais para a formação de nuvens. Essa atividade é intensificada pelas reações com óxidos de nitrogênio gerados por descargas elétricas na alta atmosfera, em nuvens dominadas por cristais de gelo.

Anteriormente, os cientistas já tinham registrado a presença das partículas em outra expedição, mas não haviam conseguido entender completamente o mecanismo físico-químico. Acreditava-se que o isopreno não chegaria às partes superiores da atmosfera porque reagiria e se quebraria rapidamente devido à luz solar. Com os novos achados, será possível aprimorar modelos climáticos globais, cruciais para simulações e entendimentos sobre o funcionamento atual e futuro do planeta.

Esquema de processos durante chuvas
Esquema de estudo que descreve processos que ocorrem durante chuvas, mostrando concentrações de ozônio, compostos voláteis orgânicos e partículas. Fonte: Luiz Machado et al. | Nature Geoscience

Para chegar a esses resultados, os pesquisadores utilizaram dados coletados durante a expedição científica CAFE-Brazil (Chemistry of the Atmosphere: Field Experiment in Brazil). Este experimento realizou vários voos sobre a bacia amazônica entre dezembro de 2022 e janeiro de 2023, atingindo altitudes de 14 quilômetros, equivalente a duas vezes a altura do Aconcágua, o pico mais elevado da América do Sul. Ao todo, foram 136 horas de voo, cobrindo uma distância de 89 mil km, o que é mais do que duas voltas completas ao redor da Terra na linha do Equador.

Luiz Augusto Toledo Machado.

Aeronave de pesquisa do projeto CAFE-Brazil
FOTO: Aeronave de pesquisa do projeto CAFE-Brazil logo após a decolagem. Foto: Dirk Dienhart | Instituto de Química Max Planck

Luiz Augusto Toledo Machado, que também é pesquisador do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (IF-USP) e colaborador do Departamento de Química do Instituto Max Planck, na Alemanha, afirma que os achados abrem novas possibilidades para analisar os efeitos do aquecimento global sobre o clima e o ecossistema.

Já para Paulo Artaxo, coordenador do Centro de Estudos Amazônia Sustentável (CEAS) da USP e coautor do artigo, os resultados obtidos possibilitam simulações climáticas mais robustas, permitindo a inclusão de novas variáveis sob a perspectiva físico-química e biológica.

“A emissão de isopreno é diretamente vinculada à floresta em pé. Se a vegetação nativa for substituída por pastagens ou cultivos de soja, essa emissão não ocorrerá. O desmatamento provoca a destruição desse mecanismo de formação de partículas, resultando na diminuição da geração de nuvens e, consequentemente, da precipitação. É o que chamamos de realimentação negativa no sistema climático, pois a redução da vegetação leva a uma diminuição significativa da precipitação por meio da diminuição da evapotranspiração e da produção de partículas dependentes das emissões de isopreno”, ressalta Artaxo.

Dados recentes do MapBiomas, que utilizou imagens de satélite, apontam que a principal razão para o desmatamento na Amazônia entre 1985 e 2023 foi a expansão de pastagens, que cresceu em mais de 363%, passando de aproximadamente 12,7 milhões para 59 milhões de hectares. Atualmente, cerca de 14% da Amazônia se transformou em áreas de pastagem.

A floresta emite uma variedade de compostos orgânicos voláteis (VOCs), entre os quais se destaca o isopreno, cujas emissões globais somam mais de 500 milhões de toneladas anualmente, sendo que um quarto disso é oriundo da Amazônia. Este gás é liberado durante o dia sob a influência da luz solar, e anteriormente pensava-se que ele não atingiria as camadas mais altas da atmosfera, pois reagiria rapidamente com os radicais hidroxila presentes nesse estrato. Contudo, a pesquisa demonstrou que, à noite, há uma quantidade considerável de isopreno que pode ser transportada para a alta atmosfera.

O isopreno é transportado para camadas superiores pela convecção intensa durante tempestades tropicais à noite, semelhante a um aspirador, impulsionado por correntes de ar ascendentes em áreas muito úmidas e aquecidas. O gás entra em reações com compostos nitrogenados resultantes de relâmpagos, formando nanopartículas de aerossóis nas altas altitudes, onde as temperaturas podem chegar a -60°C. Após o nascer do sol, os radicais hidroxila reagem com o isopreno, levando à produção de nitratos orgânicos, que são diferentes daqueles que se formam próximo ao solo, resultando em altas concentrações de nanopartículas.

Essas nanopartículas atuam como núcleos de condensação para a formação de nuvens, influenciando assim o ciclo hidrológico global, o balanço de radiação e o clima. O entendimento de como esses compostos nitrogenados orgânicos se formam será incorporado em modelos climáticos, melhorando as previsões de chuvas, especialmente nas regiões tropicais.

A Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) está apoiando o estudo através de um Projeto Temático vinculado ao Programa de Pesquisa sobre Mudanças Climáticas Globais (PFPMCG), liderado por Machado. Outros quatro projetos, que investigam a interação entre gases traços, aerossóis e nuvens na Amazônia, também recebem apoio da FAPESP.

Outra pesquisa publicada na mesma edição da Nature menciona a nova formação de partículas a partir do isopreno na troposfera superior, em uma série de experimentos que reproduzem as condições atmosféricas presentes em altitudes elevadas.

A experiência CAFE-Brazil realizou diversos voos que ajudaram a gerar perfis de altura para diferentes gases, permitindo uma análise mais aprofundada das massas de ar na troposfera superior e as diferenças entre as condições diurnas e noturnas.

Equipe de pesquisa do CAFE-Brazil
Machado, à esquerda, durante um dos voos. Foto: Acervo Pessoal

A base das operações foi estabelecida em Manaus (AM), com voos realizados utilizando o avião HALO (High Altitude and Long range research aircraft), destinado a expedições em altitudes elevadas, com alcance superior a 8 mil km e capacidade de carga de até 3 toneladas. O projeto contou com a colaboração de instituições de renome, como a Universidade Goethe de Frankfurt, o Instituto Max Planck de Química (Alemanha), o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA).

Recentemente, outro estudo também ligado à temática foi publicado na revista Nature Geoscience, ecenso que revela a capacidade da floresta em gerar suas próprias nuvens a partir de aerossóis induzidos pela própria precipitação, contribuindo assim para novos processos de chuvas na região.

Os artigos Isoprene nitrates drive new particle formation in Amazon’s upper troposphere e New particle formation from isoprene in the upper troposphere estão disponíveis, respectivamente, em: AQUI e AQUI.

Fonte: Guia Região dos Lagos

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