O estado de São Paulo registrou entre os dias 22 e 24 de agosto um impressionante total de 2,6 mil focos de calor, com 81,29% deles localizados em áreas destinadas à agropecuária, incluindo canaviais e pastagens. Essa informação foi divulgada após uma análise realizada pelo Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM) e ganhou destaque pelo fato de que, em um único dia, foram reportados mais focos de calor no estado do que em toda a Amazônia.
A análise, publicada no dia 27 de agosto, utiliza dados de satélites que detectam focos de calor e informações sobre uso e cobertura da terra, referentes ao ano de 2023, elaboradas pela Rede MapBiomas, da qual o IPAM é membro. Além disso, foram empregadas imagens do satélite GOES para observar a dispersão da fumaça e anomalias térmicas.
Ane Alencar, diretora de Ciência do IPAM, comentou que “não é normal que tantos focos de calor apareçam em um intervalo tão curto, especialmente em um estado como São Paulo”. Para ela, a situação assemelha-se a um “Dia do Fogo” específico para aquela região, o que ficou evidente pela cortina de fumaça que se formou ao oeste do estado.
A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, também se manifestou de forma semelhante durante uma coletiva de imprensa. Segundo ela, “não é aceitável que em tão poucos dias haja tantas frentes de incêndio afetando simultaneamente diversos municípios” em São Paulo.
Foco em 90 minutos
As imagens do satélite geoestacionário que coleta dados a cada dez minutos revelam que as colunas de fumaça começaram a se formar em um breve intervalo de 90 minutos, entre 10h30 e 12h do dia 23 de agosto. O dado é ainda mais alarmante quando se considera que o satélite que detecta focos de calor passou pela região duas vezes, uma pela manhã e outra no final da tarde. Durante esse mesmo dia, o número de focos saltou de 25 para 1.886.
Em análise detalhada, foi observado que, dos focos de calor identificados em áreas produtivas do estado de São Paulo, 44,45% (ou 1.200 focos) surgiram em áreas destinadas ao cultivo de cana de açúcar. Outros 19,99% (524 focos) foram registrados em áreas do tipo “mosaico de usos”, que englobam tanto pastagens quanto agricultura. Além disso, 9,42% (247 focos) estavam localizados em pastagens, e 7,43% (195 focos) em áreas de silvicultura, soja, citros, café e outros tipos de cultivo.
No que diz respeito à vegetação nativa consumida pelo fogo, foram registrados 440 focos, o que corresponde a 16,77% do total de ocorrências nos três dias de análise. As formações florestais sofreram os maiores danos, respondendo por 13,57% dos focos de calor no estado.
“Os dados indicam que o principal alvo das queimadas foram áreas já desmatadas, ou seja, aquelas que já estavam sob algum tipo de utilização. Assim, pode-se inferir que, caso o fogo tenha atinge uma área de vegetação nativa, é provável que ele tenha escapado do local de origem”, avalia Wallace Silva, analista de pesquisa do IPAM.
Os municípios mais afetados
Cinco cidades respondem juntas por 13,31% dos focos de calor registrados no período analisado no estado de São Paulo. Pitangueiras ocupa a liderança com 3,36%, seguida por Altinópolis com 3,28%, Sertãozinho com 2,4%, Olímpia com 2,17% e Cajuru com 2,1%. Quase todas essas localidades estão situadas na região de Ribeirão Preto, exceto Olímpia, que pertence à área de São José do Rio Preto.
Para Ane Alencar, independentemente dos resultados das investigações que estão sendo conduzidas pelo governo federal sobre esses incêndios, é fundamental reformular a maneira como o Brasil interage com o uso do fogo.
“Seja provocado de forma coordenada ou não, é imprescindível que se diminua o uso do fogo nas práticas agropecuárias, além de que haja uma responsabilidade maior no controle do fogo quando este for empregado. O uso indiscriminado do fogo pode causar prejuízos irreversíveis tanto ao meio ambiente quanto à segurança e à vida de cidadãos que, mesmo distantes, sentem os efeitos da fumaça”, conclui Alencar.