Túnel coloca em risco moradores e várias árvores na Zona Sul de SP

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túnel senadora madureira em São Paulo
Construção do túnel pode deixar mais de 500 pessoas desabrigadas e derrubar quase 200 árvores na região da Av. Sena Madureira, Zona Sul de São Paulo. Foto: Agência Pública
A reportagem sobre o túnel na Vila Mariana, Avenida Sena Madureira, foi originalmente publicada na Agência Pública.

“Esta é a casa que eu construí. Minha economia inteira está aqui. Vim para cá aos 29 anos e agora estou com 65. Trabalhava em dois empregos e todo o dinheiro que juntei foi para esta casa”, relata Laurenilda Maria dos Santos, referindo-se ao lar que começou a construir com o cônjuge há 36 anos e onde vive com a filha e três netos.

Residente da comunidade Sousa Ramos, que está situada dentro da Vila Mariana – um dos bairros mais valorizados de São Paulo – Laurenilda enfrenta o temor da possibilidade de ser forçada a deixar seu pequeno lar. “Nós não temos para onde ir”, afirma.

Desde setembro, cerca de 200 moradores da comunidade foram pegos de surpresa com a introdução de máquinas e caminhões em uma área adjacente que, na última revisão do zoneamento, foi designada como “zona especial de proteção ambiental”.

Em questão de dias, parte do córrego que atravessava a região foi coberta, e as árvores que compunham o morro foram cortadas. “Todos choravam, choravam”, menciona Laurenilda.

“Fiquei tão afetado que nem consegui registrar o ocorrido em fotos. Apenas permaneci parado, sentindo uma profunda dor”, conta Eduardo Canejo, um morador de 16 anos da comunidade, que também atua como presidente da associação local.

Laurenilda Maria dos Santos, moradora da comunidade Sousa Ramos
Laurenilda Maria dos Santos, de 65 anos, é moradora da comunidade Sousa Ramos há 36 anos. Cozinheira aposentada, sempre trabalhou nas proximidades. Agora vive com a filha e os netos na casa que construiu juntamente com o marido. Foto: Agência Pública

Recentemente, o início da obra da prefeitura tem como objetivo a construção de um túnel de aproximadamente 500 metros, partindo da rua Sena Madureira, passando sob a avenida Domingos de Morais até a rua Maurício Francisco Klabin, com a intenção de aliviar o trânsito de veículos.

Sugestões para essa obra foram feitas pela primeira vez na década de 1970, mesmo antes da implementação da Linha 1-Azul do Metrô. O projeto foi licitado em 2011, mas a execução foi suspensa em 2013, por falta de recursos no orçamento, e as empresas envolvidas, o consórcio Queiroz Galvão e Galvão Engenharia, foram investigadas na operação Lava Jato.

Embora o contrato tenha sido suspenso repetidamente até 2019, em 2022 o projeto tornou-se uma prioridade para a gestão do atual prefeito, Ricardo Nunes (MDB), que almeja a reeleição. A obra foi reativada pela Galvão Engenharia e pela Queiroz Galvão, que agora se apresenta como Ayla Construtora.

A iniciativa envolve a remoção de várias famílias que habitam 85 casas na comunidade Sousa Ramos, muitas com crianças e idosos, incluindo cinco pacientes em tratamento contra o câncer nos hospitais locais.

Atualmente, a prefeitura ainda não contatou oficialmente os moradores. Com base em documentos públicos, eles têm ciência de que o trajeto do túnel afetará sua comunidade, que ocupa um terreno municipal. Moradores de uma comunidade vizinha, parcialmente em área privada e pública, também devem ser realocados.

Os impactos dessa obra são preocupantes, visto que removerá mais de 200 pessoas que habitam na Sousa Ramos há décadas – e que ainda não foram informadas sobre suas condições de realocação.

Conforme relatos de Anália do Nascimento, residente há 28 anos na Sousa Ramos, “Temos uma comunidade que existe há mais de 50 anos. É impossível que repentinamente sejamos obrigados a sair, como se fôssemos lixo.” Sua filha mais velha se formou em direito em uma faculdade próxima, e o filho mais novo planeja ingressar em breve.

Manifestantes contra a obra do túnel na Sena Madureira
Anália do Nascimento, com 57 anos, reside na comunidade há 28 anos. “Investimos uma vida toda aqui. É inaceitável que agora, de repente, o prefeito chegue com máquinas e nos trate como se fôssemos invisíveis,” desabafa. Foto: Agência Pública

Este projeto se transformou em um verdadeiro pesadelo para muitas famílias, que se sentem desrespeitadas e negligenciadas. “A situação de todas as famílias é insustentável. Não fomos informados, orientados ou instruídos sobre essa obra”, afirma Magda Moreira, uma moradora de 25 anos, durante uma reunião na Assembleia Legislativa de São Paulo.

A construção afetará a nascente do córrego Embuaçu, que já apresenta partes concretadas, levando ao abate de pelo menos 172 árvores. O plano de compensação ambiental prevê, no entanto, o plantio de aproximadamente 260 mudas na área da obra. Árvores adultas já foram removidas da área de proteção ambiental adjacente à Sousa Ramos.

O dinheiro investido nesta obra, estimado em R$ 531 milhões, tem o propósito de aliviar a congestionamento em um único sinal, o cruzamento da rua Sena Madureira com a avenida Domingos de Morais. Apesar disso, a prefeitura justifica que “a obra atende às exigências ambientais e beneficiará mais de 800 mil cidadãos que transitam pela região diariamente.”

Traçado do túnel da Sena Madureira em São Paulo
Imagem que mostra o trajeto do túnel da Sena Madureira, elaborado pela prefeitura, revelando as comunidades que precisarão ser desapropriadas. Fonte: Agência Pública

Além disso, a proposta do túnel levanta questões sobre a mobilidade urbana, como o que acontecerá com os ciclistas na ciclofaixa da Sena Madureira e o corredor de ônibus planejado para a mesma rua. Conforme o Plano de Mobilidade Urbana da cidade de São Paulo, que foi estabelecido em 2015, deveria ter sido construído um corredor de 2,2 km até 2024, mas até agora não houve progresso nesse sentido.

Durante o primeiro debate do segundo turno das eleições municipais, o prefeito Ricardo Nunes (MDB) foi questionado sobre o tempo que os cidadãos paulistanos dedicam ao transporte público e por não ter implementado os 40 km de corredores previstos no plano de metas.

O prefeito, em resposta, mencionou alguns corredores supostamente já entregues e outras obras em andamento, incluindo a “retomada do túnel da Sena Madureira”, mas não esclareceu como um projeto voltado para automóveis beneficiaria os usuários de ônibus.

A prefeitura sustenta que o túnel “também é uma via para ônibus e veículos utilitários”, garantindo que melhorará a fluidez do trânsito na área. Esse discurso conquistou o apoio de parte da comunidade da Vila Mariana.

Uma apresentação realizada pela Secretaria de Mobilidade e Trânsito (SMT) mencionou como vantagens da obra a eliminação do cruzamento entre a Sena Madureira e a Domingos de Morais, “melhorias na acessibilidade de diversos bairros do Corredor Sul-Sudeste, desde o Morumbi até Vila Prudente”, além de “mais uma alternativa de acesso à Rodovia dos Imigrantes”.

“Querem nos colocar em outro lugar”

Imagem do desvio na obra do túnel na Sena Madureira
Visualização de como ficará a saída do túnel, atualmente ocupada pela comunidade Sousa Ramos e uma área de proteção ambiental. Foto: Agência Pública

Os residentes da Sousa Ramos se encontram sem saber o que será do futuro, uma vez que suas vidas estão intrinsecamente ligadas às oportunidades e serviços disponibilizados pela Vila Mariana, como linhas de metrô, transporte público acessível, hospitais, boa qualidade de saúde, creches e escolas públicas e particulares. Ninguém deseja ser forçado a se mudar.

“Criei minha filha aqui. Fiz a vida dos meus filhos aqui. Tenho um profundo amor por este lugar”, diz Ana Maria Barbosa, de 55 anos, que vive na comunidade há 27 anos. Seu filho mais novo, Lucas, de 20 anos, parece claramente angustiado. Ele frequenta a faculdade no Ipiranga e trabalha no Jabaquara, bairros próximos. “Meus deslocamentos são sempre de metrô”, diz ele.

Moradora da comunidade Sousa Ramos contra a obra do túnel
Ana Maria mostra uma foto que tirou do momento em que a vegetação da área verde foi removida. “Eles chegaram sem nos avisar e nos assustaram com essa obra. Ninguém fala nada. Nós não somos nada?” pergunta ela.

O gerente Fagner Teixeira da Costa manifesta sua estranheza com a possibilidade de ter que abandonar a casa que sonhou, com cada detalhe planejado, que representa uma grande realização. Ele e sua esposa trabalham nas proximidades, e seu filho de quatro anos estuda em uma creche vizinha.

Sem informações oficiais até o momento, há conjecturas entre os moradores sobre a oferta de um auxílio-aluguel temporário de R$ 400 ou uma indenização de cerca de R$ 30 mil, embora os imóveis na comunidade sejam avaliados em torno de R$ 150 mil cada. “O que podemos fazer com R$ 30 mil? Mal conseguimos comprar um barraco”, questiona Geralda Alves Monteiro, uma mulher de 77 anos.

O estudo de impacto ambiental de 2009 para o licenciamento do túnel já presenciava o problema: “A região tem alto valor imobiliário, tornando inviável a manutenção das famílias ali, além da dificuldade de criar unidades habitacionais populares.”

Um documento recente da Secretaria Municipal de Habitação (Sehab) indicava uma reunião com os moradores para discutir o atendimento habitacional e o cadastramento das famílias para o início de outubro. No entanto, até agora, não houve qualquer iniciativa nesse sentido.

Questionamentos foram enviados a diversos órgãos municipais a respeito da obra, mas a prefeitura respondeu apenas em uma única nota, sem esclarecer todos os pontos abordados. Em relação a famílias afetadas, foi afirmado que “as que residem em terrenos públicos impactados pela obra receberão assistência habitacional, podendo optar pela indenização ou pela realocação em uma nova unidade”.

“Eles pretendem nos realocar para áreas distantes”, critica João Batista, de 63 anos, que já viveu essa experiência em outras remoções. Ele não deseja deixar a comunidade, que oferece a infraestrutura necessária, já que é aposentado e faz tratamento de saúde na região. Segundo informações da prefeitura, a comunidade Sousa Ramos, oficialmente estabelecida em 1949, foi considerada em 2016 uma Zona Especial de Interesse Social, onde deveria haver iniciativas para promover a regularização fundiária, procedimento que estava sendo executado pela Sehab, mas que foi paralisado devido à construção do túnel.

Quando a construção foi licenciada há 13 anos, valia outro zoneamento. O “direito de protocolo” sugere que a proposta vigente na época da licitação deve ser levada em conta. O Plano Diretor da cidade, de 2014, estipula que as normas das Zonas Especiais de Interesse Social prevalecem sobre qualquer outro zoneamento.

Desvio em licitações e suspeitas

As secretarias responsáveis pela obra tentaram encontrar maneiras de retomar o projeto sem abrir nova licitação, alegando que isso seria uma perda de tempo e recursos. Entretanto, as mudanças significativas que ocorreram na cidade ao longo da última década e a crescente desconfiança em torno das empresas envolvidas não foram levadas em consideração.

Em 2018, o executivo Dario de Queiroz Galvão Filho afirmou, em delação premiada, que o ex-prefeito Gilberto Kassab direcionou a licitação do túnel em 2011 para beneficiar a Galvão Engenharia, que teria doado R$ 1 milhão ao DEM. A assessoria de Kassab, à época, alegou que a licitação foi realizada de maneira correta.

Placa informativa da obra do túnel na Sena Madureira
Na rua Sena Madureira, ao fundo, a placa da obra que anuncia o túnel. Em frente, um cartaz destinado aos ciclistas que foi pichado com a palavra “contra o túnel”. Foto: Agência Pública

“Esse projeto é de extrema importância para o prefeito [Ricardo Nunes]. Ele me telefonou e declarou que devemos retomar o túnel Sena Madureira, cumprindo meu compromisso de finalizar essa obra durante minha gestão”, afirmou o secretário de Infraestrutura e Obras, Marcos Monteiro, durante uma audiência pública em agosto de 2022.

Segundo ele, a suspensão do contrato foi prorrogada até 2019, o que exigiu a revisão da “questão legal”, sendo que a Procuradoria da prefeitura e a Controladoria garantiram que a execução do contrato era viável financeiramente.

Na justificativa, o secretário explicou que os valores definidos em 2010, de R$ 223 milhões, haviam sido ajustados para R$ 366 milhões em 2020, mantendo-se o mesmo “desconto” oferecido pelas empresas. Uma nova licitação estimou um custo de R$ 369 milhões. “Consideramos que essa ligeira diferença justifica a continuidade do projeto”, afirmou.

Contudo, pareceres da Controladoria-Geral do Município levantam questões sobre a real existência de descontos na licitação. O órgão investigou licitações que envolveram a Galvão Engenharia e a Queiroz Galvão e identificou “indícios de sobrepreço” nas despesas realizadas durante a execução inicial do túnel, em 2011.

Recentemente, a Controladoria-Geral aplicou uma multa de R$ 5,57 milhões à Ayla por irregularidades em outras licitações, mas mitigou a penalidade que impediria a empresa de negociar com a administração pública por seis meses.

A Galvão Engenharia sofreu sanções também por práticas “anticompetitivas” e fraudes em outras licitações, com uma multa de R$ 3,58 milhões. No dia 14 de outubro, a Controladoria determinou providências para invocar a declaração de inidoneidade da empresa, que inviabilizaria sua participação em futuras licitações e contratos públicos.

Em maio deste ano, as empresas tentaram mudar a composição do consórcio, mantendo a Ayla e substituindo a Galvão pela Engibras Engenharia, algo que foi negado pela Secretaria de Mobilidade e Trânsito.

Questionamentos foram enviados ao prefeito a respeito das denúncias de corrupção e das decisões da CGM, mas apenas uma nota foi fornecida pela prefeitura, que afirmou que “a intervenção foi reestabelecida após consulta ao Tribunal de Contas do Município (TCM) e possui Projeto de Compensação Ambiental (PCA) com nova avaliação de impacto à vizinhança, entre outros documentos necessários”.

Falta de clareza na comunicação

Área de proteção ambiental impactada na obra do túnel
Já impactada pela obra, a área de proteção ambiental teve árvores cortadas e parte do córrego coberta. Foto: Agência Pública

Inusitadamente, as placas informativas sobre a construção mencionam o nome “Consórcio Sena Madureira” como responsável, em vez da real identidade do consórcio, que é Galvão Engenharia e Ayla Construtora. Ao mesmo tempo, o valor de R$ 218,9 milhões indicado nelas diz respeito a 2011, enquanto o custo projetado é, na verdade, de R$ 531 milhões.

A prefeitura ainda não deu explicações acerca das inconsistências apresentadas.

Demandas pela suspensão das obras

Atos contra a obra do túnel na Sena Madureira
Placa informativa da obra apresenta cifra desatualizada e menciona o consórcio de forma inadequada. Foto: Agência Pública

A magnitude dos impactos ambientais e sociais resultou na união de diferentes grupos em oposição à construção do túnel, englobando ciclistas, moradores dos prédios vizinhos e os próprios membros da comunidade Sousa Ramos.

“Estamos lutando para que a obra seja interrompida e que um diálogo adequado com a população seja estabelecido”, declara Eliana Barcelos, presidente da associação de moradores da Vila Mariana. Um abaixo-assinado promovido pela associação já angariou mais de 9 mil assinaturas.

“Não se trata apenas de um projeto desatualizado que prioriza o transporte rodoviário”, destaca Lucian de Paula, arquiteto e urbanista do Coletivo Metropolitano de Mobilidade Urbana. “É uma estratégia disfarçada para expulsar uma das poucas comunidades existentes na Vila Mariana. Durante meu tempo como conselheiro, questionei a subprefeitura sobre planos habitacionais para o bairro e a resposta foi de que, por haver pouca pobreza, não havia necessidade de um plano.”

No último domingo (13 de outubro), os moradores da região realizaram o terceiro ato contra a obra desde o início deste mês, portando faixas que denunciavam os cortes de árvores, enquanto fixavam cartazes nos postes locais. Logo no dia seguinte, os mesmos postes foram pintados de branco.

Vários deputados estaduais e vereadores, tanto em exercício quanto recém-eleitos, também levantaram questões a respeito do projeto, inclusive acionando o Ministério Público de São Paulo (MPSP), que, até o presente momento, buscou esclarecimentos junto à prefeitura, mas não pediu a suspensão das obras. Atualmente, três procedimentos estão em curso no MPSP, ressaltando possíveis irregularidades. Além disso, um inquérito civil se desenrola na 6ª Promotoria de Justiça de Habitação e Urbanismo desde 2022.

Apesar da retomada da obra, que se deu 15 anos após a realização do estudo de impacto ambiental, a Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente apenas exigiu a execução de um “estudo de viabilidade ambiental”, um processo que requer menos trabalho técnico e perícia do que o licenciamento atual. Este estudo confirmou a presença de uma nascente na área do projeto, configurando, portanto, uma Área de Preservação Permanente (APP) segundo o Código Florestal. A prefeitura não se posicionou a respeito dessa questão conflitante.

Por muitos anos, os moradores melhoraram a infraestrutura em torno da comunidade, asfaltando ruas e plantando árvores na área que agora está sendo transformada em um canteiro de obras. Uma caçamba imensa guarda os restos das árvores removidas, enquanto partes do córrego têm sido gradualmente fechadas. Nos dias recentes, sem explicações, o barulho na obra diminuiu, com menos trabalhadores circulando e as máquinas desligadas. Contudo, o dano já foi causado, e o futuro da Sousa Ramos permanece incerto.

Edição: Giovana Girardi | Agência Pública

Uma petição online clama pelo fim das obras do túnel na Sena Madureira. Se você concorda com essa solicitão, é possível assinar a petição, AQUI.

Para mais informações, assista ao vídeo abaixo:

 

 

Fonte: Guia Região dos Lagos

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