Hambúrguer de babaçu é desenvolvido na Amazônia Maranhense

queijo vegano

Inovação na Amazônia Maranhense: surgimento de hambúrguer e farinha de babaçu

O estado do Maranhão é reconhecido pela sua ampla produção de coco babaçu, com mais de 300 mil pessoas, conhecidas como quebradeiras de coco, dedicadas a essa atividade. Em uma iniciativa que associa saberes tradicionais a conhecimentos científicos, dois novos produtos foram desenvolvidos: um hambúrguer feito de babaçu e uma farinha de amêndoas resultante do processamento deste fruto.

Esses novos produtos não apenas visam promover saúde e nutrição, mas também se inserem em um mercado crescente no Brasil que busca alternativas naturais e ricas em proteína. Esse esforço conjunto já havia originado outras inovações, como biscoitos, gelados, uma bebida semelhante ao leite e um produto análogo ao queijo, todos confeccionados a partir do coco babaçu.

O desenvolvimento desses coprodutos envolveu a participação de várias organizações locais, incluindo a Cooperativa Mista da Agricultura Familiar e do Extrativismo do Babaçu – Coomavi, em Itapecuru-Mirim, e a Associação Clube de Mães Quilombolas Lar de Maria, da comunidade Pedrinhas Clube de Mães em Anajatuba, junto à Associação de Quebradeiras de Coco de Chapadinha. Também estiveram envolvidos pesquisadores da Embrapa Maranhão, Embrapa Agroindústria Tropical, Universidade Federal do Maranhão (UFMA) e Universidade Federal do Ceará (UFC), em parceria com a Rede ILPF, com o respaldo financeiro da Agência Alemã de Cooperação Internacional (GIZ) no Brasil.

Queijo feito de babaçu, uma alternativa de queijo vegano
Queijo de babaçu. Foto: Flavia Bessa

A principal meta deste projeto era valorizar o trabalho das quebradeiras de coco e resgatar o babaçu como um produto da sociobiodiversidade brasileira, promovendo a diversificação dos coprodutos gerados pela palmeira para atender a nichos de mercado. Dentre as inovações, o bagaço gerado a partir da extração do óleo da amêndoa foi transformado em farinha, que possui potencial para ser utilizada como matéria-prima em outros produtos, como o hambúrguer análogo ao convencional e em receitas como biscoitos, pães, bolos, mingaus e sorvetes, contribuindo para a economia e satisfação dos consumidores.

A pesquisadora Guilhermina Cayres, que lidera o projeto, explicou que os novos produtos foram desenvolvidos levando em consideração as particularidades das agroindústrias comunitárias e os conhecimentos tradicionais das quebradeiras. O processo incluiu melhorias e padronizações que atenderam às boas práticas de processamento e normas de segurança alimentar, além de considerar a aceitação sensorial dos produtos, o que resultou em maior valorização das amêndoas quebradas e a diversificação na produção.

“Desenvolvemos uma sinergia entre conhecimentos técnicos e tradicionais para agregar valor à produção artesanal e explorar nichos de mercado específicos, como os que envolvem a identidade sociocultural e aqueles voltados a dietas com restrição de glúten e lactose. Os alimentos derivados do babaçu têm potencial para contribuir na construção de sistemas alimentares que valorizam a identidade sociocultural de comunidades tradicionais do Maranhão, gerando inclusão produtiva e riqueza com baixo impacto ambiental, além de posicionar o estado como uma referência em bioeconomia e utilização sustentável de produtos da sociobiodiversidade”, afirma a pesquisadora.

Integração de saberes: uma metodologia inovadora

O Professor Harvey Villa, do Departamento de Engenharia Química da UFMA, detalha que a metodologia utilizada para chegar ao hambúrguer inovador foi diferente do convencional. Em vez de desenvolver o produto em laboratório primeiro, eles realizaram uma avaliação prévia das condições locais e do potencial das matérias-primas, incluindo os resíduos. A amêndoa do coco babaçu, inicialmente empregada na extração de óleo, gerava uma torta que era usualmente utilizada como ração animal, mas que possui um alto teor de lipídios e carboidratos. Esse viés de reaproveitamento foi crucial, uma vez que buscavam utilizar 100% do produto, e isso foi alcançado com sucesso. A farinha utilizada para o hambúrguer não é do mesocarpo, mas da amêndoa, que agora deixa de ser um resíduo e torna-se matéria-prima. Adaptaram o processamento às realidades das quebradeiras, sempre respeitando suas exigências, permitindo que o desenvolvimento dos produtos ocorra de forma simples, mas correta do ponto de vista higiênico e sanitário”, explica Villa.

Do aspecto físico-químico, a farinha da amêndoa é altamente adequada para o hambúrguer, utilizando a casca de banana como estruturante, juntamente com a amêndoa, para proporcionar sabor e maciez na fritura, além da farinha de arroz que atua como aglutinante e, em combinação com temperos, garante a validade e qualidade nutricional do produto vegano.

Mulheres quebradeiras de coco durante o processo de pesquisa de novos produtos
As mulheres quebradeiras estiveram presentes desde o início da pesquisa. | Foto: Flavia Bessa

O percentual de proteína no produto final chega a 13,17% para cada 100g, valor considerado adequado para esse tipo de alimento, que não contém conservantes e pode durar até seis meses se congelado. Após várias formulações, foram selecionadas duas principais: uma com casca de banana e outra com polpa de jaca. Optou-se por continuar o desenvolvimento do hambúrguer feito com amêndoa de babaçu e casca de banana devido à regularidade e maior disponibilidade da banana ao longo do ano.

A professora Yuko Ono, nutricionista e membro da equipe técnica da UFMA, ressalta que a casca de banana possui propriedades funcionais, com vários sítios ativos que ajudam na absorção de metais, como o cobre, que é prejudicial à saúde em concentrações elevadas. “Além disso, a casca é mais rica em fibras, vitaminas e minerais do que a polpa, e contém uma quantidade significativa de pectina, que contribui para a melhora do sistema gastrointestinal e para a prevenção de doenças crônicas”, acrescenta Ono.

O bolsista Jefferson Marinho compartilhou suas experiências durante o processo de produção do hambúrguer: “Iniciamos do zero, com a intenção de replicar as características organolépticas que mais se assemelham à carne, utilizando ingredientes específicos, como a farinha de amêndoa do babaçu, que é extremamente rica do ponto de vista nutricional”. A colaboração entre pesquisadores e as quebradeiras de coco resultou em uma definição criteriosa dos métodos de preparo e ingredientes.

Rosângela Lica, da Coomavi, explica como a farinha da amêndoa foi descoberta. “Utilizávamos o bagaço do óleo na alimentação animal. Nossa prática comum era fazer farinha do mesocarpo. Aprendemos a assar e torrar o bagaço no forno até o ponto ideal e transformá-lo numa farinha da amêndoa que substitui perfeitamente o coco ralado em várias receitas, oferecendo muito mais crocância e aceitação do consumidor, pois os produtos são 100% feitos com babaçu”, destaca.

Para Alana Licar, também membro da Coomavi, os resultados foram extremamente positivos, conferindo mais sabor e qualidade, ao mesmo tempo em que evitam o desperdício e proporcionam um produto saudável, utilizando matéria-prima abundante. Antonia Vieira, da comunidade quilombola Pedrinhas Clube de Mães, reforça a importância da participação das mulheres ao longo de todo o processo de pesquisa. “Fazemos parte deste projeto, que é muito enriquecedor para nós e para os pesquisadores. Esta troca de experiências é maravilhosa”, comemora.

Pela criação do hambúrguer, a equipe técnica liderada por Guilhermina Cayres foi reconhecida como finalista do prêmio Con X Tech Prize: Amazônia, uma competição global que procura inovações tecnológicas e científicas capazes de transformar economias extrativistas da Amazônia em economias sustentáveis e regenerativas.

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