Como o banco utiliza o seu dinheiro?

O que o banco faz com seu dinheiro?

Bancos são avaliados em novas diretrizes de responsabilidade socioambiental

Bancos Responsáveis
Foto: Guilherme Stecanella | Unsplash

Os bancos que abrem contas para seus clientes realizam avaliações detalhadas, que incluem a análise de crédito, conhecida como Score, que indica a confiabilidade do cliente em cumprir com seus compromissos financeiros. Entretanto, é interessante propor uma inversão desse olhar: e se os clientes pudessem ter uma visão clara a respeito de como os bancos administram os fundos que eles depositam? O “Guia dos Bancos Responsáveis” surgiu com o objetivo de oferecer esse entendimento.

Este guia, publicado a cada semestre, examina os compromissos públicos das instituições financeiras em relação a 18 temas que estão distribuídos em três categorias principais:

  • Temas transversais: que incluem bem-estar animal, mudanças climáticas, corrupção, igualdade de gênero, direitos humanos, direitos trabalhistas, sustentabilidade ambiental e questões fiscais;
  • Temas setoriais: abrangendo áreas como armamentos, agricultura, florestas, mineração, petróleo, gás e geração de energia;
  • Temas operacionais: que envolvem a proteção ao consumidor, inclusão financeira, pagamentos, transparência e prestação de contas.

Na sua décima edição, o “Guia dos Bancos Responsáveis” analisa os desempenhos dos oito maiores bancos do Brasil, que juntos detêm 71,7% dos ativos do sistema bancário nacional, ou seja, Banco do Brasil, BNDES, Bradesco, BTG Pactual, Caixa Econômica Federal, Itaú Unibanco, Safra e Santander Brasil. Os resultados da avaliação, no entanto, são alarmantes: numa escala de 0 a 10, a média das notas ficou em apenas 3,3 entre os 18 temas analisados.

dinheiro dólares
Foto: Pixabay

Analisando com mais profundidade cada um dos temas, as notas caem significantemente. No que se refere às práticas voltadas para garantir uma alimentação adequada para a população, levando em consideração não apenas suas operações, mas também a concessão de crédito e os investimentos realizados, a média entre os bancos foi alarmantemente baixa, somando apenas 0,7.

De acordo com o Idec, a avaliação não se limita à atuação interna dos bancos, mas também contempla quatro categorias principais de serviços financeiros, que envolvem créditos corporativos, financiamento de projetos, gestão de recursos próprios e gestão de recursos de terceiros.

vida financeira sustentável
Foto: Michele Henderson | Unsplash

Essa análise é conduzida pelo Instituto de Defesa do Consumidor (Idec) em parceria com quatro outras organizações civis do Brasil, sendo elas: Conectas Direitos Humanos, Instituto Sou da Paz, Oxfam Brasil e Proteção Animal Mundial.

A metodologia utilizada no “Guia dos Bancos Responsáveis” foi desenvolvida pela rede Fair Finance International e pela consultoria de sustentabilidade Profundo, localizada na Holanda.

Destaques do Guia: alimentação e mudanças climáticas

Alimentos

Na seção que aborda o tema “alimentos”, o guia examina a garantia de uma alimentação adequada com foco em aspectos relacionados ao agronegócio e à indústria alimentícia. É esperado que os bancos priorizem a concessão de crédito e incentivem as empresas financiadas a reduzir o uso de agrotóxicos e a zelar pelo bem-estar dos animais de produção. Além disso, são analisados os esforços voltados à promoção da agricultura orgânica e à diminuição do consumo de carne.

Este tema foi um dos que apresentou as piores notas na avaliação atual, ficando atrás apenas do tópico “bem-estar animal”. A ausência de políticas que promovam uma alimentação livre de agrotóxicos e que garantam o bem-estar animal por parte dos bancos e das companhias que recebem financiamento se fez evidente durante a análise.

alimentos bancos

Nenhum dos bancos analisados se comprometeu formalmente a garantir o direito a uma alimentação saudável e adequada através de seus financiamentos e investimentos. Aqueles que obtiveram nota zero não apresentaram nenhuma política exigindo das empresas que diminuam o uso de agrotóxicos na produção agrícola ou que adotem medidas para evitar a emissão de substâncias tóxicas em seus projetos.

O BNDES apresentou a melhor média entre os avaliados neste tema, embora não esteja no patamar ideal, visto que possui uma política que valoriza a ecoeficiência, exigindo relatórios de sustentabilidade de grandes projetos.

O Banco do Brasil, por sua vez, destacou-se ao incentivar a redução do uso de fertilizantes nitrogenados em sua política de crédito, listando agrotóxicos e pesticidas como itens restritos ao financiamento.

Feira de alimentos orgânicos
Feira de alimentos orgânicos. | Foto: Alexandre Nunis

A Caixa Econômica Federal também promove a limitação do uso de agrotóxicos e, em sua publicação de 2016 sobre agricultura, sugere que as empresas adotem um sistema que considere as práticas socioambientais de seus fornecedores. No entanto, essa é apenas uma recomendação em vez de uma política formal.

Segundo Julia Catão Dias, coordenadora do programa de Consumo Sustentável do Idec, antes de decidir investir em um projeto, os bancos deveriam ter a obrigação de realizar uma avaliação rigorosa dos riscos que esse financiamento pode trazer para pessoas e para o meio ambiente.

Mudanças climáticas

A seção sobre mudanças climáticas examina a pegada de carbono das instituições financeiras e a adequação de seus portfólios às metas estabelecidas internacionalmente para limitar o aumento da temperatura a 1,5ºC. Além disso, analisa as estratégias de transição para uma economia de baixo carbono, que inclui a substituição de combustíveis fósseis por fontes renováveis. O guia também considera se os bancos estão estimulando as empresas que financiam a medir, divulgar e reduzir suas emissões, bem como a intenção de eliminar gradualmente financiamientos com altas emissões de gases do efeito estufa.

Bancos e mudanças climáticas

Diante da emergência climática, uma problemática que afeta todos os seres vivos, os bancos Safra e BTG Pactual ainda não definiram metas de redução de suas próprias emissões em conformidade com o limite de 1,5°C do aumento da temperatura global. Eles também não publicam um inventário das emissões de gases do efeito estufa em suas carteiras de crédito e investimentos. Esses e outros, como a Caixa Econômica Federal, carecem de estratégias de desinvestimento de setores com alto impacto, como carvão, petróleo e gás.

Além disso, os bancos Banco do Brasil, BNDES, Bradesco, Itaú e Santander estabeleceram estratégias para reduzir gradualmente financiamientos para empresas e projetos nas áreas de mineração e combustíveis fósseis.

Emissões de GEE
Foto: Chris LeBoutillier | Unsplash

Em geral, a maioria dos bancos avalizados aplica suas políticas apenas aos financiamentos, enquanto o Banco do Brasil e o Itaú se destacam por estabelecer diretrizes restritivas também para seus investimentos diretos no setor de carvão.

Outro fator preocupante é que quase todos os bancos não divulgam informações sobre suas emissões absolutas de gases do efeito estufa, impossibilitando uma análise mais precisa do impacto ambiental de suas atividades.

Desmatamento no Cerrado
Foto: Moisés Muálem | WWF-Brasil

As instituições financeiras também têm deixado de lado compromissos de desinvestimento em setores críticos, como a exploração de petróleo e gás. Além disso, a falta de salvaguardas climáticas na administração de ativos, tanto próprios quanto de terceiros, é uma preocupação crescente, uma vez que os compromissos nesse sentido são praticamente inexistentes.

Expectativas e realidade

O Idec enfatiza que o cenário atual revela uma desconexão alarmante entre as expectativas da sociedade civil e as realidades impostas pelas crises socioambientais que enfrentamos, sugerindo a necessidade urgente de que os bancos adotem compromissos e diretrizes mais rigorosas.

“É crucial que as instituições financeiras implementem critérios estritos em suas políticas que tratam de questões socioambientais e climáticas, além de aplicar de forma prática medidas efetivas para prevenir, mitigar e reparar qualquer violação de direitos decorrente das ações das empresas que financiam ou nas quais investem”, conclui a análise do Instituto.

Para mais informações sobre como seu banco está classificado em cada um dos temas analisados, clique aqui. A plataforma também permite que os cidadãos enviem reclamações diretamente para os bancos, incentivando a população a se envolver com a maneira como seu dinheiro é gerido.

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